Se plantarmos um vegetal qualquer — digamos um grão de feijão — e o colocarmos num lugar longe da luz solar, todos sabemos que, ao nascer o pezinho de feijão, este vai “procurar” a luz do sol. É até um exemplo banal.
Se numa superfície qualquer espalharmos uns grãos de açúcar e no meio deles colocarmos um grão de plástico em tudo idêntico na aparência a um grão de açúcar e por ali passarem formigas, depois de pouco tempo não restará um só grão de açúcar e, pelo contrário o grão de plástico continuará intacto, talvez até sem ter tocado por nenhuma das formigas.
O que leva a plantinha a “procurar” a luz e a formiga a desprezar o plástico?
Os estudiosos explicam que Deus Criador “imprime” instintos em cada ser vivo de modo a não cometer erros. Nos seres irracionais — dizem com razão os mesmos estudiosos — esses instintos, por assim dizer, obrigam o ser a não errar, ou seja sempre acertar. É a bondade divina que assim dispõe para preservar suas criaturas.
Ao homem, entretanto, Deus deu mais: deu a razão, a consciência, a inteligência. E para que pudesse ter méritos ao praticar o bem, deu o livre arbítrio, uma liberdade de escolha. Liberdade essa que, bem exercida, deve levar a escolher sempre o bem, a verdade. Por quê, muitas vezes, o homem escolhe o erro ou o mal?
É sobre esse tema que o Mons. João Clá, Fundador dos Arautos do Evangelho, trata no que publicamos a seguir.
O ENTRECHOQUE DA VERDADE ABSOLUTA COM AS FALSAS VERDADES
Mons. João Scognamiglio Clá Dias, EP
Há no mais fundo da alma humana uma entranhada aspiração posta por Deus, à maneira de instinto, que a orienta constantemente na procura da verdade.
Após a falta de nossos primeiros pais, entretanto, essa busca não está isenta de dificuldades, pois o pecado original privou nossa frágil natureza do dom de integridade, concedido pelo Criador para dotá-la de perfeito equilíbrio. Por essa razão, estabelecida em nós a luta entre uma lei superior e uma inferior, em geral vence a segunda.
Isso se passa, sobretudo, em relação ao orgulho, terrível pecado capital que se encontra na raiz de todas as ofensas a Deus e tem como uma de suas piores consequências a negação da verdade. Quando o homem não adere plenamente ao que o Senhor lhe pede na Lei e prefere seguir o desregramento das próprias paixões, ele precisa criar uma “verdade” que justifique suas más ações. E lhe será mais fácil aceitar as falhas das pseudoverdades assim elaboradas, que admitir a verdade enquanto tal. Por quê?
Quando a verdade é exposta no seu todo e de maneira convincente, a pessoa é obrigada a fazer uma escolha, que muitas vezes lhe exige abandonar seus desvios. Incomodada, ela se toma de ódio e procura um meio de sufocar o bem que lhe foi dado contemplar.
Essa realidade se verificou na História, deforma arquetípica, absoluta e imponente, com Nosso Senhor Jesus Cristo, a Verdade Encarnada. Nem sempre Ele Se apresentou no seu esplendor, mas oculto sob a carne humana mortal, porque, se tivesse aparecido tal como é, na glória da divindade, cessaria o estado de prova de seus circunstantes, os quais, postos diante da evidência, não mais teriam a possibilidade de uma escolha. No entanto, mesmo na debilidade de nossa natureza, Ele manifestou em diversas ocasiões ser “a Verdade” (Jo 14, 6), como ao dizer “Ego sum! – Eu sou!” aos soldados que procuravam prendê-Lo. Estes “recuaram e caíram por terra” (Jo 18, 6), pois não podiam negar o poder e a grandeza d’Aquele a quem buscavam como a um malfeitor.
Em sentido oposto, os fariseus haviam constituído, sob a capa de religiosidade, uma doutrina sobre a verdade inteiramente adaptada às suas conveniências. O inevitável entrechoque da Verdade absoluta com a pseudoverdade foi num crescendo, até suscitar nesses maus israelitas o desejo irrefreável de destruir o Salvador.