No dia 12 de outubro, no Brasil, ocorre uma curiosa coincidência: é o dia da Padroeira, Nossa Senhora Aparecida e também o Dia das Crianças. Não deixa de ter sua beleza que no dia da Mãe das Mães se comemore aqueles aos quais Jesus sempre demonstrou especial carinho e afeto: as crianças: “se não vos fizerdes como um desses pequeninos, não entrareis no Reino dos Céus”. (Mc 10, 15)
Neste dia em várias cidades, os Arautos do Evangelho costumam promover atividades para as crianças, distribuir-lhes presentes generosamente obtidos por quem não os pode dar diretamente e que nos solicitam fazê-lo.
Para melhor entendermos o alcance de gestos como esses, em que se dá algo — material ou espiritual —, vejamos as considerações a seguir. (*)
A grandiosidade do universo material — que a cada momento apresenta um panorama único, irrepetível, com os incontáveis seres vivos em constante renovação e as miríades de astros em incessante movimento — nos reporta a uma beleza de ordem superior observada na esfera metafísica e espiritual, talvez menos perceptível, mas por certo mais maravilhosa. Como um majestoso caleidoscópio em contínua rotação, ele reflete as perfeições do Criador, sem jamais repetir as figuras formadas pelos cristais coloridos.
Para tal, cada elemento dessa incontável variedade de seres desempenha um papel a seu modo insubstituível, ocupando um degrau nessa quase infinita escala de seres desiguais, hierarquizados e complementares uns em relação aos outros. Todos unidos profundamente pelo fato de a ordem do ser representar uma imagem de Deus, dando-Lhe uma contínua glória extrínseca.
Nesse panorama, somente Deus é “Aquele que é”, que Se basta a Si mesmo. Todas as criaturas são contingentes e, a um ou outro título, necessitam de ser complementadas por outras.
E Deus, que é a Dadivosidade, sustenta toda essa ordem dando-Se de modo contínuo, por amor às criaturas, sem necessitar para nada de nenhuma delas. Assim, desde o Alto, sucessivamente, vão os seres superiores de alguma maneira dando-se aos inferiores, numa maravilhosa cascata de amor desinteressado, por onde todos recebem e dão de si ao mesmo tempo. E, nesse relacionamento mútuo, ensina São Tomás de Aquino, “em igualdade de condições, dar é mais perfeito que receber” (Suma Teológica, II-II,q.187, a.4, ad 3).
Quanto aos homens, compreende-se ter-nos Deus criado com uma natureza sociável de maneira a nos auxiliarmos uns aos outros, material e espiritualmente, em vista da nossa santificação e da constituição de uma sociedade perfeita nesta Terra, imagem da Jerusalém Celeste, tendo sempre presente o ensinamento do Apóstolo: “Deus ama quem dá com alegria” (II Cor 9, 7).
Assim, o homem sente uma necessidade natural de doar-se, e o egoísmo representa uma desordem de alma que torna a pessoa triste e amargurada, como ocorreria com uma flor, caso esta se recusasse a abrir suas pétalas, permanecendo um botão fechado, no afã de reter o perfume para si. De que serviria ela?
O universo foi ordenado de modo a cada ser dar e receber ao mesmo tempo. Nesse sentido, na ordem humana, o ser mais frágil é a criança, pois em tudo ela depende de seus maiores. Entretanto, ao ser favorecida com um lindo presente ou uma apetitosa guloseima, há prêmio mais gratificante para o benfeitor do que receber dela um belo e inocente sorriso de contentamento? Pode-se até dizer que quem não teve essa doce experiência não viveu ainda…
Por isso, com certeza, podemos a cada dia comprovar como “há mais alegria em dar do que em receber” (At 20, 35), à semelhança do próprio Deus, a Dadivosidade em substância, em contínua e inesgotável doação.
(*) Transcrito do editorial da revista “Arautos do Evangelho”, nº 142, de outubro de 2013, p. 5. Para acessar o exemplar do corrente mês clique aqui )