Na memória do comum das pessoas a figura de Lázaro referida nos Evangelhos está relacionada a dois fatos: à ressurreição do mesmo, feita por Jesus e a do pobre mendigo à porta de um homem rico.
Muitos supõem erradamente ser a mesma pessoa.
Nos comentários aos Evangelhos dominicais, de autoria do Mons. João Clá, EP, Fundador e Superior dos Arautos do Evangelho, publicado pela Livraria Editora Vaticana ⁽¹⁾ este assunto é esclarecido.
Há dois “Lázaros” diferentes: um é uma pessoa real (Jo 11) e outro é uma figura imaginária, usada por Jesus na parábola proposta pela Igreja na Liturgia de hoje (Lc 16,20-31).
O Lázaro real, histórico, era da família mais rica de Israel, em cuja mansão na cidade de Betânia Jesus se hospedava. Era irmão de Maria Madalena e Marta. Esta última expressa todo afeto de Jesus pelos três irmãos, quando da doença mortal de Lázaro: “Senhor, aquele que tu amas está enfermo” (Jo 11,3). Acrescenta o Evangelista: “Jesus amava Marta, Maria, sua irmã, e Lázaro” (Jo 11, 5).
Nesta época, Jesus tinha se retirado para a Galileia devido as maquinações dos fariseus, mas, sabedor da morte de seu amigo querido, volta à Judeia arriscando-se a ser preso. Os Apóstolos receosos, lembram a Jesus: “há pouco os judeus te queriam apedrejar, e voltas para lá?”(Jo 11, 8). Jesus, porém, vai a casa de Lázaro, uma riquíssima mansão em Betânia.
Chegado à casa mostrou Jesus todo seu afeto pela família e em especial por Lázaro, a ponto de os próprios judeus exclamarem: “Vede como ele o amava!” (Jo 11, 36). Completa o Evangelista: “Tomado, novamente, de profunda emoção, Jesus foi ao sepulcro” e ali opera um de seus maiores milagres: ressuscita Lázaro.
Essa ressurreição chama ainda mais a atenção pois dizem a Jesus: “Senhor, já cheira mal, há quatro dias que ele está aí…” (Jo 11,39). Jesus “exclamou em alta voz: Lázaro, vem para fora!” (Jo 11, 43). E o morto de quatro dias retoma a vida.
Muitos admiraram e acreditaram em Jesus. Os fariseus, entretanto, O odiavam e murmuravam em voz baixa: “Que faremos? Esse homem multiplica os milagres”, “e desde aquele momento resolveram tirar-lhe a vida…” (Jo 11, 53)
O outro Lázaro
O outro Lázaro, não uma pessoa “em carne e osso” e sim o personagem de uma parábola (Lc 16 20-31).
Jesus o figura como mendigo vivendo à porta de um personagem rico e que, ao morrer, recebe o prêmio da eterna bem aventurança. Vivia numa situação bem diferente do Lázaro histórico: mendigava, comia as migalhas que caia da mesa do rico e “os cachorros vinham lamber suas feridas”. O Lázaro “a quem Jesus amava” entretanto era o homem mais rico de Israel. E Jesus mostra amor pelos dois; seu amor não exclui a nenhum. Por que?
No Sermão das bem aventuranças está a resposta: as palavras de Jesus são “bem aventurados os pobres de espírito”, ou seja, aqueles que, tendo ou não bens materiais — podendo portanto serem ricos —, não se apegam a esses bens mas “procuram em primeiro lugar o Reino de Deus”, pois “ninguém pode servir a dois senhores: Deus e o dinheiro”.
O pai de um amigo costumava dizer a seu filho: “Cuidado com o dinheiro: ele é um bom escravo e um mal senhor; se você se apega, torna-se escravo dele”.
Jesus não é excludente nem exclusivista: ama a cada um, rico ou pobre, desde que tenha um amor pelas coisas eternas, pois as deste mundo passam e aqui ficam. A virtude, porém, vai conosco; e vão também os apegos.
Estes, porém, levam para outra eternidade, na qual “haverá choro e ranger de dentes”, ou seja o fogo eterno.
⁽¹⁾ Mons. João Scognamiglio Clá Dias, EP, O inédito sobre os Evangelhos, Libreria Editrice Vaticana, 2012, volume VI, pp. 374-387.
One thought on “Os dois Lázaros”