Verdadeira liberdade

Uma das coisas mais tristes para quem busca modelar-se pela vontade de Deus é ver alguém escravizado por algum vício: a bebida, por exemplo.

Quem realmente procura a perfeição, sabe por experiência própria, que, pelo contrário, nada dá mais liberdade à alma do que o cumprimento dos Mandamentos. Por que?

Usemos uma imagem para bem compreender:

Quando, por exemplo, adquirimos um aparelho qualquer, novo, não só porque está como saiu da fábrica, mas porque não o conhecemos, sabemos que junto vem o “manual do usuário”. Para o bom funcionamento do aparelho é necessário seguirmos as instruções ali contidas.

O mesmo se dá conosco, seres humanos. Saídos das mãos de Deus, Ele misericordiosamente nos dá o “manual de instruções”, ou seja, os dez Mandamentos. E, assim como, se deixarmos de observar alguma instrução contida no manual de um aparelho, podemos danificá-lo ou até inutiliza-lo, assim também, se não observarmos o que Deus amorosamente estabeleceu para o nosso bom “funcionamento”, podemos correr graves riscos.

Mas há ainda uma razão mais alta para observarmos os Mandamentos: além de não nos fazermos danos, cumpriremos a finalidade para a qual Deus nos criou e, com isso, estaremos na amizade e no amor de Deus. E veremos a esse “manual” como asas para voar e não, como erradamente muitos podem imaginar, obstáculos que Deus põe no nosso caminho. Vemos, então, os Mandamentos como os “instruções para o bom uso” do “aparelho” de que falamos, mas que, no caso, somos nós mesmos.

Cumprindo-os, tem-se a certeza de estar na amizade de Deus, e esta certeza não tem preço.

UM SEGREDO

Para as almas desejosas de maior perfeição, Deus reservou um segredo que nos garante uma ainda maior liberdade. Este segredo é revelado por São Luís Grignion de Montfort em seu Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem.

São Luís inicia o seu Tratado com algo semelhante a um toque de clarim:

“Foi por intermédio da Santíssima Virgem Maria que Jesus Cristo veio ao mundo, e é também por meio dela que ele deve reinar no mundo” ⁽¹⁾.

Mais adiante acrescenta: “Deus Pai ajuntou todas as águas e denominou-as mar; reuniu todas as suas graças e chamou-as Maria. Este grande Deus tem um tesouro, um depósito riquíssimo, onde encerrou tudo que há de belo, brilhante, raro e precioso, até seu próprio Filho; e este tesouro imenso é Maria, que os anjos chamam o tesouro do Senhor, e de cuja plenitude os homens se enriquecem.

 “Deus Filho comunicou a sua Mãe tudo que adquiriu por sua vida e morte: seus méritos infinitos e suas virtudes admiráveis. Fê-la tesoureira de tudo que seu Pai lhe deu em herança; é por ela que Ele aplica seus méritos aos membros do corpo místico, que comunica suas virtudes, e distribui suas graças; é ela o canal misterioso, o aqueduto, pelo qual passam abundante e docemente suas misericórdias.

 “Deus Espírito Santo comunicou a Maria, sua fiel esposa, seus dons inefáveis, escolhendo‑a para dispensadora de tudo que ele possui. Deste modo ela distribui seus dons e suas graças a quem quer, quanto quer, como quer e quando quer, e dom nenhum é concedido aos homens, que não passe por suas mãos virginais” ⁽²⁾. (…)

 “Assim como na geração natural e corporal há um pai e uma mãe, há, na geração sobrenatural, um pai que é Deus e uma mãe, Maria Santíssima. Todos os verdadeiros filhos de Deus e os predestinados têm Deus por pai, e Maria por mãe; e quem não tem Maria por mãe, não tem Deus por pai”. ⁽³⁾

E conclui sabiamente São Luís: a melhor forma de devotar-se a Maria Santíssima, e de, por meio d’Ela chegar a Jesus, é consagrar-se como seu escravo: nós A amamos tanto que queremos em tudo fazer sua vontade. Por isso São Luís chama “a escravidão de amor”.

São Luís Grignion denomina “consagração a Jesus pelas mãos de Maria”. Ou seja, assim como Jesus veio a nós por meio de Maria, devemos ir a Ele por meio dela. Assim contaremos com o amparo maternal de Maria para uma ainda maior liberdade.

 

(1) São Luís Maria Grignion de Montfort, Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem, Ed. Vozes, Petrópolis, 46ª edição, 2015, nº 1. p. 19

(2) Idem, nº 23-25, p. 32-33.

(3) Idem, nº 30, p. 37.

 

Ilustrações: Arautos do Evangelho, Gustavo Krajl, Wikimedia.

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